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Parto por aí I - relato de parto da Carine Zanotto

Quando eu estava grávida, adorava ler relatos de parto, mas só lia os que eu considerava ideais, humanizados e etc. Hoje em dia, o feminismo me salvou e quero dar voz às mulheres. obviamente tenho predileção pelos partos humanizados, partos naturais, partos domiciliares, pois acho esse o melhor modelo de assistência, mas uma mulher bem informada faz escolhas sensatas dentro de sua realidade.

AVISO: CONTÉM RELATO DE VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA.

Quer mandar seu relato? envia email para plantaomaterno@gmail.com com fotos!

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(Carine e Júlia)

"Já passavam das 40 semanas, e Júlia ainda não havia dado sinal de que estava chegando. Eu tinha a festa de casamento de um primo muito querido para ir. Eu que pensava que, nesta data, já estaria com Jujuba no colo, não tinha nem pensado em roupa, ou qualquer preparativo para a festa. Conversei com minha mãe, e meus familiares que são médicos sobre ir ou não, e todos foram unânimes: se estiver se sentindo bem, vamos! Arrumei uma roupa de improviso, pois às 40s + 3d só no improviso mesmo. Fui! Bela e faceira! Tudo muito lindo! E eu me sentindo super bem, a considerar que quase não consegui comer (não cabia nada), nem ficar sentada, porque a barriga era enorme!!! Caminhei prá lá e pra cá, até umas 2h da manhã. Peguei uma carona com os primeiros convidados que foram embora, estava cansada, e fui para casa, pois a festa, aquela altura estava só começando. Deitei, e apaguei. Lembro apenas de ouvir meu irmão chegar umas 5h da manhã, mais ou menos. Até então, eu não estava sentindo nada! E estava ficando aflita. Me perguntava: como pode gente? Quase 41 semanas e nada dessa danadinha querer nascer? Será que vou ter que induzir? Será que é normal não sentir nada nada a essa altura? Eu mal tinha contrações de treinamento, nada de sair tampão, nada da barriga baixar.

Enfim, esperar era tudo que eu poderia fazer. Pois bem. Sete horas da manhã, acordei com um pouco de dor lombar, mas pensei que pudesse ser o colchão de molas, que já estava mais pra lá do que pra cá. Levantei, enchi uma bolsa de água quente, e me deitei de novo. Todos dormiam, a casa em silêncio. Cochilei e fui acordada por aquela dorzinha chata. Ela ia e voltava. Comecei a pensar que pudesse ser trabalho de parto, mas a verdade é que a gente nunca sabe ao certo. Minha primeira gestação, meu primeiro parto. Comecei a monitorar no cronômetro. A danada era fraquinha, mas estava vindo de 5 em 5, 7 em 7 minutos. Levantei e fui tomar um banho. Ainda que em dúvida, era como se no fundo eu soubesse, que estava chegando a hora. Agi naturalmente. Dava umas cutucadas na barriga pra ver se estava tudo bem. A cada cutucada, Julia respondia me cutucando de volta. Lá pelas dez da manhã, pedi a minha vizinha (amigona) que me levasse ao hospital, só para ter certeza se estava tudo ok.

Parto SUS, então nada de ligar para o G.O pra perguntar o que fazer. Ah, lembro que minha vizinha tirou uma foto da minha barriga, estava bem baixinha, como se tivesse se deslocado uns 5 cm para baixo, e eu sentia como se estivesse respirando melhor. Bem, chegamos no hospital, fiz uma fichinha básica, subi para a maternidade, aguardei. Me chamaram, entrei. Perguntas básicas de triagem, o temido exame de toque. - Está dilatando. 2 cm. Colo duro ainda, mas tá vindo. Buscopam, e vai pra casa. Volta quando as contrações ritimarem." Eu, como gestante obediente que era, fui. Almocei. Levantei, sentei, caminhei. Apertei os lábios. Tentei dormir. Como sempre fui meio dramática, ninguém levou muito a sério a possibilidade do parte estar de fato se aproximando. Tomei mais um banho. Fui fazer xixi, e de repente: o tampão! Nossa, que sensação intensa! Finalmente estava acontecendo. Ela estava vindo! A tão chegada hora, de fato, havia chegado. Mas, como as contrações não haviam ritmado, esperei. Mantendo a calma, respirando, usando a bolsa de água quente. A dor começou a aumentar. Mas, eu sabia, que dava para esperar. E o tempo foi passando, passando. Chegou a noite, fui dormir. Mas deixei minha "anja" (a vizinha amigona), de sobreaviso. Quando eu deitei, as dores estavam intensas, contrações com um pouco mais de ritmo, comecei a cronometrar. E elas estavam ritimando mesmo. Embora, desde o início, elas já estavam curtinhas. De 7 em 7, 5 em 5. E desde a hora que deitei, umas 23h, até as 2h e 40 min da madrugada, eu cochilava, me virava, respirava. Mas, chegou uma hora que eu senti que era o momento de ir para o hospital. Fui. Cheguei lá, fiz todo o protocolo padrão, e fui para o toque. 4 cm. A médica, meio bruta, estava me deixando ansiosa. E triste. Mas transcendi. E segui firme no meu propósito. Me mandaram para o quarto, para esperar dilatar. Mas gente, muito ruim isso. Eu com dor, um quarto com outras mulheres, gente conversando, luz acesa. Fiz uma ceninha e voltei para a sala de pré-parto. Lá fiquei com mais uma mamãe. E gemia aquela moça! Eu estava sentindo muita dor. Mesmo. Mas eu lembrava de tudo que havia lido, sobre respirar durante as contrações, manter a calma...e ela gemia tanto, que eu pensava: - "Gente, será que minha dor vai chegar a esse ponto?". Mas, mais uma vez, transcendi. Minha mãe estava me deixando nervosa. Pedi pra ela ir pra casa. Deveria ser umas seis e pouco da manhã. Quase 24h de TP. Ela foi, chegou minha tia. Muito melhor. Ela mais tranquila, e eu fui ficando também. Felizmente, trocou o plantão, e entrou um G.O fofíssimo. Mais velho, um querido. Tudo foi acontecendo. Tudo foi fluindo. Quanto mais calmas estivermos, melhor. Ele fez o toque, estava em 5 cm. Ah, parênteses: lá no início, quando cheguei, as 3 da manhã, eu tinha vontade fazer cocô, e as meninas deixavam eu ir no banheiro. Depois de uma certa hora, não deixavam mais, pois as dores se confundem, e podemos acabar parindo no vaso!. Voltando. Já eram umas nove da manhã, chamei a enfermeira. Vou fazer cocô flor. Ela disse: - "Vou chamar o Dr.". Ele veio, toque, dilatação total. Lembro das palavras dele até hoje: - "Daqui a 15 min, pode levar pra sala de parto!". Oh, my god! Chegou a hora, gracias dio. Eu já estava suplicando por cesárea. Mentalmente, mas estava. Pensava em sair correndo, roubar um banco, pra subornar algum médico, sei lá. Bom, seguindo. Fui pra sala de parto, subi naquela mesa que mais parece uns instrumento de sadomasoquismo (acho até que é). Touquinha, pano nos pés, coisarada, perna aberta. G.O pede para chamar o pediatra. O pediatra chegou, e as contrações pararam! O G.O brincou dizendo que isso era a "síndrome da mesa de parto". Rimos. Ele só dizia, quando sentir vontade de fazer força, avisa. Demorou um pouco, e veio. Ele disse: "- Vai, força!". E eu: -"to fazendo". E ele: -" Ta nada menina, tem que ser forçaaaaa". E eu fiz. Uma, duas. Manobra de kristeller (uma enfermeira na minha barriga empurrando). Sabia que era violência obstétrica, mas transcendi. Ninguém mandou ter vergonha de fazer um plano de parto. Bebê vinha,e voltava, vinha e voltava. G.O disse: -"vou cortar". Eu retruquei: -" corta não. Tem certeza que precisa?". Ele garantiu que sim. Eu sabia que talvez não, mas ele foi convincente em seus argumentos: -" Se eu cortar, posso controlar o tamanho do corte, e fica mais fácil suturar. Se eu não cortar, pode lacerar. Vai dar na mesma, mas vai doer bem mais, pois pode ser um rasgo bem maior". -" Corta Dr.!". Anestesiou, cortou. Mais força, nada. Tava ficando tenso. Ouvi ele pedir para enfermeira preparar o forceps de alívio, para que, na próxima força, quando apontasse a cabecinha, ele pudesse segurar. Quanto a forceps, já tinha lido um monte, e eu sabia que era tranquilo precisar usar. E assim foi. Força, forceps, nasceu!

Aí bate aquele pânico, tá respirando meu deuso? Colocaram ela em cima da minha barriga. Nunca vou esquecer. Pezinhos verdinhos. Pequeninos. Enrugados. A sensação mais libertadora da minha vida. Eu nascia para a vida. Agora, como mãe! Levaram ela para trocar. G.O suturou. Ele perguntou se eu sabia que tinha que "nascer a placenta". Respondi afirmativamente. Sai a placenta, ele drenou meu útero para não ter cólicas futuras. Fui para o quarto na cadeira de rodas. (Detalhe que não quero esquecer: eu tinha um plicoma anal, tipo um verruguinha no fiofó. Perguntei para o G.O o que era, como tirava e tal. Ele disse que, como eu havia me comportado, ele ia tirar para mim. Agradeci a gentileza.) Bebeia nasceu as 10h e 17 min. 3,070 kg. Linda e loura. Fui para o quarto, almocei. Ela veio, enroladinha. Sensação louca. Estasiante. Peguei no colo. Dei a teta. Esfomeada, mamou até o que ainda não tinha. Fim.

Ps: escrevo este relato, há um ano e cinco meses depois de parir. O parto normal é algo tão intenso na vida da gente, que as memórias ficam muito presentes. Dói pra cacete. Mas agradeço imensamente à vida, por ter me permitido viver cada segundo. Foi libertador!"

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